A busca eterna

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A busca eterna

O que buscamos? Esta é uma pergunta que ninguém formula para si, talvez por intuir que não pode ser respondida satisfatoriamente. Busca-se algo, sem dúvida, obedecendo a um anelo; entretanto, eis o dilema: esse algo é ideal ou real?

Geralmente, ele é constituído por uma aspiração ou um desejo indefinido, que sempre se teme pôr às claras. É o que costuma ocorrer a quem procura uma mesa de jogo: não define seu pensamento dizendo que seria muito feliz se ganhasse uma quantidade determinada de dinheiro, porque sabe que, tão logo alcançasse essa cifra, procuraria chegar a outra maior, o que poria em perigo o que tivesse ganhado. A mesma coisa acontece com aquele que busca solucionar suas dificuldades econômicas: sem incorrer numa falsidade, não poderia precisar em que consiste sua aspiração. No caso de se encontrar em situação precária, por efeito de estritas necessidades domésticas, pensará em ganhar mais, em ter uma casa ampla, ou mais comodidades na casa que ocupa. Seu empenho e preocupação se limitarão a conseguir isso, mas, tão logo o tenha alcançado, vai ocorrer que a satisfação e tranquilidade do bem conquistado durarão muito pouco, pois a nova posição lhe imporá outras obrigações. A isso se somará, sem dúvida, o desejo de exibir aos olhos de conhecidos e amigos a mudança experimentada em sua situação, e ainda terá de adicionar algo que faça com que essa situação se mostre melhor do que em realidade é. Logicamente, logo haverá de voltar a afligir-se, ansiando outra vez por superar seu estado econômico, o que se irá tornando algo insustentável para ele.

Não se trata, aqui, de a pessoa se conformar, passivamente, com aquilo que desejou, buscou ou obteve em determinando momento. Isso implicaria ir contra a própria lei natural, que não fixou limites para as possibilidades humanas. Trata-se, sim, de a pessoa se pôr em sintonia com essa lei, para não perder o equilíbrio nas alturas e levar um escorregão que a faça rolar para o abismo. E esse equilíbrio se perde quando, paralelamente à escalada das novas posições, o indivíduo não se preocupa em adquirir a ilustração necessária para saber comportar-se em cada ambiente em que lhe caiba atuar, sempre de acordo com as possibilidades econômicas ou sociais conquistadas.

Observando isto com amplidão de mente, não com critério estreito, pode-se ver que os únicos culpados de tais situações são os próprios interessados. Estes são os que buscam uma e outra coisa sem terem a mais remota noção do que na verdade querem ou, então, sem serem capazes de se adaptar à realidade, pretendendo que ela se adapte a suas exigências.

É comum atribuir à má sorte ou à fatalidade o fato de as coisas, depois de um período de relativa calma, voltarem a andar mal. É que se pensa sempre em “ter mais”, pensamento este que encerra pura cobiça, e jamais, salvo em raras exceções, em “ser mais”, que implica, acima de tudo, um trabalho de superação das próprias condições quanto à capacitação e à ilustração. O ignorante que aspira a ser rico, mas que despreza toda oportunidade de se instruir, caso chegue a sê-lo só o será fugazmente, porque o dinheiro escapará pelas frestas de seu estado rudimentar ou incultura. Ainda poderá estar, como vemos acontecer, condenado a não poder desfrutá-lo, porque viverá com o que poderia viver qualquer um, reduzido a um mínimo de gastos e sujeito, por outro lado, à tortura produzida pelo temor de ser roubado.

De que serve para essas pessoas ter muito dinheiro, se não se preocupam em usá-lo para sua ilustração, evolução e felicidade pessoal? Elas alegam, geralmente, carecer de inteligência para o estudo, razão pela qual não lhes interessa cultivar suas qualidades. Entretanto, a Providência, que tudo prevê e que é o pensamento de Deus atuando em toda a vida universal, oferece a esses seres de escassa cultura os meios de se ilustrar e alcançar conhecimentos, sem terem que recorrer ao esforço, por vezes duro, que o estudo exige. Outra coisa não são as viagens que podem realizar pelo país em que vivem, pelo continente ou pelo mundo inteiro, se as possibilidades econômicas lhes permitirem. Pensemos no que é melhor para a vida: enchê-la com a riqueza dos conhecimentos e emoções que lhe podemos proporcionar, ou privá-la dessa possibilidade, guardando em cofre-forte o dinheiro, para continuarmos vivendo às escuras, envoltos na espessa venda da ignorância, como ocorre às cédulas entre as espessas paredes de aço que as guardam.

Continuando o pensamento que inspira estas linhas, diremos que, a não ser uns poucos, ninguém é consciente do que busca ou quer, pois o que hoje busca ou quer raramente é igual ao que buscará ou quererá amanhã. O homem vive à mercê das circunstâncias, das situações, já que, satisfeita a primeira busca, o espírito, inquieto por excelência, exige novas coisas. Quão distante da realidade e da verdade está quem diz: “Ah! Se eu tivesse isso eu seria a pessoa mais feliz deste mundo!” A posse de uma coisa, quando não se tem o conhecimento daquilo que tal posse deve representar para o gradual desenvolvimento das faculdades cuja soma contém o poder da própria criação, logo deixa de ser grata e, às vezes, até se torna insuportável. Falamos do poder da criação individual, aludindo, naturalmente, às possibilidades que cada ser humano tem de superar suas condições e aperfeiçoar-se. Isso implica criar em si mesmo a semelhança com a imagem que se quer alcançar, em direção sempre ascendente rumo à perfeição.

O que foi que os filósofos da Antiguidade buscaram, assim como os da era moderna e contemporânea? Aqueles o sabiam? Sabem estes? Não há dúvida alguma que intuíram, mas daí a sabê-lo com consciência existe uma grande distância.

Não se deve esquecer que, quando o homem se aprofunda na busca de algo, sempre descobre coisas de valor igual ou maior que o valor daquilo que buscava. Apesar disso, muitos sentiram suas esperanças frustradas ao não darem com o propósito perseguido. Esse é o caso das almas pretensiosas, às quais nada mais estimula, porque carecem de incentivo próprio, daquele incentivo que guarda uma tão estreita relação com a inclinação para o elevado e belo, e que se converte em vocação quando a vontade se afirma na inalterável resolução de superação e aperfeiçoamento.

Quando alguém expressa: “Eu gostaria de ter isto ou aquilo”, só está formulando uma vaga e pálida ideia do que em realidade quer. É preciso alcançar a consciência do que deve significar para a vida cada finalidade que anima um propósito; é preciso saber buscar aquilo que seja para o próprio bem e, com uma visão ainda mais ampla, saber estender esse bem aos semelhantes. Estaremos, assim, garantidos contra qualquer pensamento mesquinho e, já de posse do anelado ou buscado, saberemos desfrutá-lo sem nunca experimentar o cansaço que leva à indiferença e que, além de nos tornar injustos, nos coloca na posição de não merecedores de uma nova oportunidade.

Raumsol (Carlos Bernardo González Pecotche)

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